Reconhecimento

Reconhecimento

É no mínimo curioso que a memória social – também chamada de história –consagre generais, líderes, diretores de empresas, herdeiros. E, por consequência, condene ao esquecimento tantos outros.

Generais com vidas longevas e salários generosos ganham nomes de rua. Jovens soldados mortos em batalhas se misturam na pólvora do anonimato. Líderes políticos são biografados e garantem pódios nas mitologias nacionais.

Enquanto isso, a massa de lutadoras e lutadores que fizeram de uma causa sua razão de viver, muitas vezes, não herdam sequer um obituário. Suas aventuras e desventuras vão engrossar a poeira do olvido.

Steve Jobs tem mais frases escritas sobre ele do que grana que faturou. Para a história passará a mentira de que ele era a Apple. Técnicos, contadores, vendedores, secretárias da maçã mordida nunca são lembrados.

Para interromper esse meu lamento, proponho um rodízio de celebridades. Que se escreva um livro sobre o chef de cuisine e outros sobre os cortadores de cebolas e atendentes das mesas. Que se entreviste a presidenta e a faxineira da megaempresa.

Que se saúde os líderes, os donos, os ricos, os vencedores. Mas também que se dê o justo crédito a todos que, de uma forma ou de outra, garantem que haja líderes, donos, ricos, vencedores.

Se concordamos que ninguém se faz sozinho, que não existe obra feita a uma só mão, por que na hora da homenagem, do registro, nos esquecemos disso? Essa é uma das razões da desigualdade que tanto nos fere.

O culto à personalidade não é coisa apenas de regimes políticos autoritários e ultrapassados. Ele está presente nas mídias que consultamos diariamente. Está presente nas marcas que escolhem o “vencedor da vez” para nos vender seus produtos.

Uma hora, alguém corajoso terá que dizer: “Chega. Cansei das celebridades televisivas, políticas, jurídicas, interneteiras. Basta de ouvir a mesma pessoa falando sobre os mesmos assuntos. Cansei de especialistas!”

Assim nos aproximaremos de uma nova visão, mais equitativa, na qual se enxergue e se celebre os coletivos. A vida das camareiras, das enfermeiras, dos motoristas. Enfim, a história dos construtores de reinos.

Artigo indicado pelo meu amigo Danilo Dourado.
Escrito por : Fernanda Pompeu

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